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terça-feira, 30 de abril de 2013

Inferno Verde



Durante a Era Áurea, as florestas de Aester já sofriam as depredações do progresso. Tudo que restara da Grande Floresta Este, que ia desde a distante Anatólia até à sombra dos montes Galeivianos foram alguns Hectares de bosques reais e pomares. A Floresta Obscura que encobria toda a Teudônia foi reduzida a um pequeno núcleo, que só era poupado porque ela era – e sempre foi – considerada amaldiçoada por monstros, fadas e elfos. Todas as grandes florestas foram severamente reduzidas, ao ponto de que grandes nações como Valesia, Astúria e Galei importavam ou extraiam sua madeira de outras partes do mundo. As florestas que restavam eram defendidas ferozmente pelas criaturas da floresta, principalmente elfos e gnomos, que barravam com todas as forças o desenfreado e destrutivo progresso humano que em nada tinha na consciência em poupar a natureza, como uma vez haviam tido.

Após a Guerra Final, muito do que restava da natureza foi destruído ou corrompido. Se não fosse a intervenção do corte Seelie da fadas, Aester seria hoje um deserto árido e inóspito, com apenas alguns focos de natureza corrupta e estagnada. De Elfhamme, os elfos trouxeram vastas quantidades de verde e magia para rapidamente curar e proliferar a natureza em Aester novamente. Os elfos vieram em massa para Aester, dispostos a transformá-la em algo mais semelhante a Elfhamme, sua terra natal. Quanto aos humanos, os elfos pretendem tomá-los como alunos do caminho correto a se trilhar, mas até que aprendam tudo, eles estão proibidos de gozar totalmente dos prazeres que a natureza tem a oferecer.

Muitos humanos se agarraram aos ensinamentos élficos com afinco, o resultado foi que hoje existem muitas comunidades mistas de humanos e elfos dentro das agora vastas florestas de Elfhamme, inclusive toda uma nação de humanos e meio-elfos surgiu sob a filosofia élfica. A verde nação de Corellion.

 Mas nem tudo foram flores, os vizinhos de Elfhamme se encontram invejosos dos elfos e daqueles que eles chamam de “amantes de elfos”. Toda aquele tesouro verde é essencial para a reconstrução da humanidade, no entanto os elfos se recusam a partilhar toda a vasta floresta, fazendo a humanidade tendo que se contentar com pedaços insuficientes de verde daquela vastidão, ou os bosques definhados e fedorentos existentes dentro de seus próprios territórios. Estas nações resistem ao máximo em absorver a influência élfica e buscam por meios de conseguirem expulsar os elfos da floresta que um dia foram de seus antepassados, e um dia, assim eles esperam, voltará a ser deles. Coro, Galei e Irine são as nações que mais se ressentem com os elfos desta maneira.

 Outro grande oponente de Elfhamme e sua filosofia é a poderosa nação humana de Al-Hazad. Estes invasores e colonos do oriente dominam quase metade de Aester. Muitas nações Asterianas jazem hoje subjulgadas sob o domínio de Al-Hazad, sendo Asturia, Cartália e Anatólia as principais. Al-Hazad tem muito interesse em possuir as vastas florestas mágicas de Elfhamme e arredores e em capturar os próprios elfos para comercializá-los como escravos, declarando assim guerra aos elfos para conquistar o que eles veem como seu por direito. Mas eles subestimaram os elfos e tiveram derrotas estrondosas uma atrás da outra. A campanha de conquista a Elfhamme foi um fracasso vergonhoso, mas antes que se tornasse um desastre para Al-Hazad eles negociaram uma paz com Elfhamme. Na realidade, Al-Hazad ainda se opõe a Elfhamme, agora de forma indireta. Grupos de aventureiros, mercenários e empreiteiros são contratados por Al-Hazad para trazer madeira de Elfhamme e escravos. Al-Hazad aprendeu da pior maneira que capturar um elfo para a escravidão podem ter consequências terríveis pelas mãos da família do capturado enfurecida, mas a mesma retaliação não ocorre quando os escravagistas capturam meio-elfos, e é por isso que esta raça virou alvo principal dos caçadores de cabeças contratados pelos Hazadi.



 Aester Noroeste é uma região de inúmeros contrastes. Luxuriantes e belas áreas verdes e um estilo de vida mágico e, aparentemente, pacífico se avizinham a terras pobres açoitadas por um grande cataclismo. Um local onde três culturas completamente distintas se chocam e tentam dominar umas a outras. Onde todos querem o grande prêmio verde e se acham no direito de reivindicá-la para si. Àqueles que ouvem falar de Aester Noroeste, dos elfos e florestas, chama o local de paraíso dentro do inferno. Mas apenas aqueles que vivem no assim chamado paraíso podem constatar é o fato de que este paraíso... ainda é o inferno. Um Inferno Verde.

 Facções do Inferno Verde 

Corte de Elfhamme: Organização mista de Gnomos, Fadas, Meio-Elfos e, principalemente, Elfos. A Corte de Elfhamme tem como objetivo espalhar a cultura élfica em Aester, regenerar as terras devastadas pela Tempestade e afirmar a supremacia elfica no continente.

Corte de Esmeraldas: Comunidade composta principalmente de gnomos e fadas. Reclusos e tímidos, esta organização é a mais antiga da região, e são peritos em defender seu território e se manter invisível ao fazê-lo.

Povos Independentes da Floresta Obscura: Comunidades independentes da floresta obscura que adotaram total ou parcialmente a filosofia élfica e, por isso, são tolerados pelos mesmos na grande floresta.

Nação do Povo de Corellion (NPC): Nação composta de comunidades semi-independentes de humanos que adotaram a filosofia élfica. Corellion é onde há a maior comunidade de meio-elfos de Aester – e de elfos fora de Elfhamme.

Ministério da Exploração de Irine: O ministério da Exploração de Irine mandam delegações de exploradores e extrativistas a Elfhamme para realizar “estudos e outras atividades extrativistas”, sendo na realidade pouco mais que mercenários extrativistas enviados pela República em busca de recursos.

Escravagistas Hazadi: Organização especializada na procura e captura de meio-elfos de Elfhamme para o mercado de escravos. Oriundos de vários locais, a maioria não admite que trabalham para Al-Hazad.

Extrativistas Hazadi: Organização que funciona da mesma forma e voracidade que os escravagistas, mas seu objetivo é a extração de madeira e instalação de campos madeireiros.

Bando Verde: Organização de Homens e mulheres que vivem da floresta. Decididos a serem o braço armado em defesa do Inferno Verde e de seus habitantes. O Bando verde não se diz associado com nenhuma outra organização. Defendendo todos seus habitantes contra elfos e humanos com força igual.

Al-Amaranth: Como parte da negociação de paz, um Califa Hazadi chamado Amaranth comprou uma estreita faixa de terra cultivável de Corellion, para isso, concordou em nunca formar um exército, nem ambicionar interesses fora da terra adquirida. Al-Amaranth existe como mais um marco vergonhoso para Al-Hazad, mas é um porto de neutralidade seguro no meio de tantas facções conflitantes na região.

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Dama da Espada, Parte 3

O pequeno pátio não era tão grande quanto ela se lembrava e seus muitos caminhos não eram tantos assim quanto ela esperava, havia apenas um beco sem saída e uma ruela paralela ao que ela acabou de sair. Sabia que não podia retornar por onde vinha, pois no caminho até o pátio estavam cheios com seus perseguidores.
 No caminho até o pátio, a garota conseguiu derrubar dois perseguidores, mas o último samurai que ela derrubou soltou um forte grito de dor antes que ela pudesse nocautea-lo. O grito havia atraído um terceiro que se pôs determinado em direção ao som. Quando um samurai de bigode encerado e rosto bastante enrugado apareceu, a ronin o recebeu com um chute no peito que o desequilibrou e desferiu um forte golpe com seu boken no ombro do samurai fazendo-o se ajoelhar numa perna, mas ouviu outros se aproximando e não pode finalizá-lo, pondo a se movimentar para o pátio de kemari, onde achava que podia ter o benefício do terreno conhecido.

 Ao chegar ao pátio, constatou que estava cercada. O pátio era cercado por casas muito apertadas uma na outra, haviam uma outra rua paralela ao que ela veio, mas era bem provável que os samurais estivessem subindo por ela também, uma rua maior ao norte entre duas casa se provou apenas um beco sem saída com um cercado alto de madeira impedindo a passagem. Haviam pequenas frestas entre as casas, mas eram muito estreitas, talvez ela conseguisse se espremer através de uma delas, mas de nada valeria. Se ela não se encalhasse no percurso, ela demoraria tanto que os samurais poderiam conseguir cerca-la e simplesmente esperar ela aparecer numa das extremidades e espetá-la.Se ela já não estivesse cansada, ela tentaria muito bem pular aquele cercado, ou ira pela rua paralela, driblar o guarda e continuar subindo, mas ela estava exausta de fugir. A ronin aprendeu desde muito cedo a respeitar toda a vida e nunca desferir um golpe mortal, mas brevemente pensou se isso seria prudente quando se visse cercada por quatro samurais armados com lanças e espadas, mas pôs este pensamento de lado.

Não tendo mais para onde ir, decidiu fazer uma resistência no próprio pátio, pelo menos até criar uma nova oportunidade para continuar sua fuga, ela era apenas uma e eles eram pelo menos quatro, para vencer ela deveria enfrentar um de cada vez, embora a situação tenha ficado complicada, pois foi traída pela lembrança.

Ouviu um barulho vindo da ruela de onde havia vindo e se preparou. Se aproveitando de um armador de roupas se ocultou e esperou o samurai se aproximar, cedo o corpulento homem saia do corredor gritando.

-Sei que você está aí, apareça covarde!

A ronin respondeu com uma rasteira, nunca foi uma mulher alta, seu pequeno corpo ficava ainda menor se comparado aos grandes samurais Kôra, mas mesmo assim conseguiu prender os pés do samurai com sua perna esquerda e empurrar os joelhos dele com sua perna direita. O samurai já com equilíbrio comprometido por conta da pequena corrida que fez para alcançá-la nada pode fazer para impedir a queda, caindo de cara no chão. A mulher rapidamente rola por sobre o corpo do samurai e enterra o cotovelo em sua nuca, fazendo o samurai perder os sentidos.  Mal se levantou, ela notou que outro samurai corria em sua direção e ouviu outro subir pela rua paralela. Recuou para o centro do pátio e esperou.

O primeiro samurai apareceu, alto e magro para um Kora, usando uma grande lança e um Chapéu cônico de ferro. Fazia calor e dava para ver que ele suava por baixo da armadura, mas sorriu triunfante ao ver a fugitiva encurralada. Logo o outro apareceu, gordo e musculoso espada na mão e concentrado, apesar de estar bastante ofegante e empapado de suor pela subida. A ronin toma uma posição de duelo, arrastando sua perna direita para traz e inclinando-se sobre o corpo, sua mão direita repousava em cima do cabo de seu boken, a palma da mão aberta, como se oferecendo um presente. O samurai gordo se impressionou com aquela postura e recuou um passo, o outro apenas riu e avançou com sua lança. 

O Boken da ronin saiu num flash de seu obi, atingindo a lança de seu adversário com tanta força que a partiu. O segundo golpe caiu com força contra o jingasa de ferro do lanceiro, o deixando tonto e sem reação, mas não o derrubando. A ronin aproveitou a desorientação do primeiro atacante para se defender do ataque do segundo, aparou um forte golpe de katana com seu boken e logo notou que o grande homem tinha muito mais força que ela. Decidiu tentar cansa-lo um pouco se desviando de seus golpes e procurando confundi-lo, girando ao redor do grande homem. O homenzarrão não conseguiu acompanha-la e abriu a guarda, uma oportunidade que a ronin usou para ir por trás do guerreiro e lhe acertar na axila. O golpe fez o homem cambalear para a frente, com uma careta de dor. Mas neste ínterim o alto samurai já havia se recobrado e sacado sua própria lâmina, avançando para cima da ronin, ela mau teve tempo de se desviar do golpe rápido, foi quando recebeu seu primeiro corte no braço. 

O guerreiro mais corpulento já havia se recuperado e partiu para cima dela com dois golpes rápidos de sua arma o primeiro a acertou na coxa, cortando a pele, mas o corte foi tão leve que ela fingiu não ter sido atingida e se desviou do segundo. Por um reflexo escapou da morte da lâmina do guerreiro de jingasa, que fez um longo corte em seu flanco, que a teria atravessado se ela não tivesse rodopiado para longe da lâmina. Seus ferimentos já estavam sendo sentidos e ela sabia que tinha que acabar com aquilo antes de perder suas forças, então investiu para cima do homem gordo chutando seus joelhos. O corpulento homem se curvou tentando protegê-los, novamente abrindo sua guarda, foi quando ela plantou seu boken na orelha dele com um poderoso ataque horizontal, fazendo-o perder a consciência imediatamente e se largar no chão como um grande saco de batatas. No entanto, o homem alto não estava satisfeito e a atingiu nas costas. Se não fosse o movimento rápido e corpo esguio da moça ela estaria morta agora. A ronin rodopia sob si mesma e se choca contra a porta de uma casa no pátio. Abaixou sua espada de madeira para sinalizar que precisava de descanso, o alto samurai concedeu, mas se preparou para abatê-la. A mulher se sentia tonta, seus ferimentos cobrando de seu corpo, sua mente escapou para a imagem de seus pais adotivos e tutores. - Haddan, Wisengashi, não posso morrer agora, tenho muito que fazer. A ronin pensou enquanto recuperava forças.

Cambaleando e mancando o terceiro samurai que ela falhou em nocautear aparece, com lança na mão e cara enrugada com expressão de indignada dor. Enquanto o que estava derrubado no chão recuperava os sentidos e se punha de pé. Ela encarou a todos fechou os olhos e meditou, alterando seu estado de espírito, ela guarda seu boken e se coloca em posição, corpo inclinado e mão direita no cabo do boken. O samurai alto parte para cima dela e é recebido com um golpe que saiu com tanta velocidade que ele mal o viu, tão pouco teve tempo de reagir. O boken esmaga o rosto do alto samurai que não consegue completar seu golpe antes de cair. Os outros dois partem para cima dela. O guerreiro enrugado joga sua lança contra a ronin, que evita ser atingida em cheio se desviando, mesmo assim a lança a corta debaixo da axila e se prende em seu kimono, a jogando novamente contra a castigada porta da casa que está atrás dela. A ronin julga ter ouvido um gemido lá dentro da casa e teme que a lança que atravessou a porta tenha feito uma vítima involuntária. Os ferimentos da ronin são extensos, ela não sabe se seu corpo e espírito vão suportar o restante da batalha, não vendo outra opção, ela cede a seu último recurso, liberando toda sua energia de luta ao um grande kiai de guerra. A dor e o corpo são esquecidos e a bruma vermelha que paira em seus olhos substitui sua consciência.



                                                                          ***

Ainda via vermelho quando abriu os olhos, tudo aconteceu brutalmente rápido. A lembrança do combate era forte em sua mente, algo que ela nunca esquecerá. O cheiro da fumaça dos incensos de sua mãe se misturava com a fumaça do fogo quando a porta do santuário foi aberta, Higoi Muzubushi recuava para dentro enquanto cortava mais um inimigo com sua espada, o último de seus guardas, mortalmente ferido com múltiplos cortes e perfurações pelo corpo tropeça para dentro se colocando entre seu senhor e os inimigos e fechando a grossa porta dupla de madeira do santuário com um estrondo, depois, não suportando mais os ferimentos, cai no chão e não se levanta mais. Muzubushi entra cambaleando olhando suplicante para sua mulher e pergunta 

- E nossa filha?

-Ela está segura. Respondeu solene e resignada Mayumi enquanto se levantava, Naginata na mão.

Muzubushi prometera fazer os Date se arrependerem de seu ataque, viu uma oportunidade de cumprir sua promessa ao avistar o decorado elmo prateado do comandante dos Date no mesmo salão da mansão em que ele e sua guarda se encontrava, mas era uma oportunidade perdida no mesmo momento em que surgiu, pois seus homens morriam ao seu redor, enquanto os homens dos Date apenas aumentavam em números. Este ataque foi cruelmente planejado para vencê-lo, justo em um momento em que ele menos esperava um ataque daquela magnitude no coração do território dos Higo. Ousado e fatal, Muzubushi teria aplaudido, se a vítima não fosse ele, sua família e sua cidade.

Logo depois os resistentes portões do santuário são derrubados e vários Date entram no salão, avançam para cima do casal, mas não são páreos para a força e perícia de Muzubushi, nem para os golpes fortes e precisos de Mayumi, caindo frente ao par a medida que se engajavam no corpo a corpo. Quando o comandante deles entra acompanhado com mais um esquadrão de samurais. Um homem alto, usando um Kabuto prateado decorado de formato ogival que termina numa coroa de louros dourada com duas andorinhas douradas voando no topo, sua armadura laqueada de azul e rosa resplandece brilhante embaixo de seu kataginu branco, com uma espada ensanguentada numa mão e um lenço de seda limpo numa outra. Seu rosto liso e belo com dois olhos azuis claros olhando fixamente para Muzubushi.   

– Eu, Date Masakane - senhor comandante da frota Date e capitão da Gaivota Marinha, filho de Date Kosakune e herdeiro da Baía das Carpas - o desafio, Muzubushi, para um duelo. Enquanto fala Masakane limpa sua espada com o lenço, fazendo o trabalho com presteza, mas sem em nenhum momento tirar os olhos do senhor de Higo no Toshi. - Se aceitar sua mulher viverá e você será honrado como herói na sua derrota.

Muzubushi está ferido e cansado e sabe que certamente irá perder o duelo, mesmo assim sabe que esta é a única chance que possui de pelo menos cumprir sua promessa e colocar um gosto de cinzas na vitória dos Date. Sabe também que é uma chance de pelo menos barganhar uma saída honrada para sua família, cansado como está, sua família é tudo que importa no momento. Mas isso não o abaterá, tão pouco demonstrará um centímetro sequer de fraqueza perante inimigo tão digno de lhe tirar a vida.

- Você é um tolo, Masakane. Rosna Muzubushi. Fala como se já tivesse vencido! Aceito seu duelo, desde que prometa que minha família será deixada em paz, e que meu povo seja tratado com honra e cortesia!

- Assim prometo. Masakane fala enquanto termina de limpar sua arma com o lenço e a guarda na bainha.

O duelo teve inicio, após os adversários andarem em círculos se estudando, eles param de frente um para o outro para iniciar o derradeiro embate. Muzubushi pratica sua postura, com a Katana a sua frente com a ponta apontada para o adversário e posição inclinada sobre sí, arrastando para trás a perna direita, característica do estilo de luta dos duelistas Higoi. Masakane toma a tradicional e mortal forma de duelo dos Date, com a arma guardada na bainha, posição ereta, arrastando levemente a pé esquerdo a frente do direito e a mão direita repousada com a palma aberta no cabo da espada, como se oferecesse um presente.

Após se encararem por um instante, medindo as forças um do outro eles começam. Mazakane saca primeiro e corta Muzubushi no peito na altura do ombro, cortando os dois braços. O golpe de Masakane deixou Muzubushi sem força nos braços fazendo seus golpes de retaliação fracos e fáceis para Mazakane aparar. Muzubushi aplica um forte golpe contra Masakane, que corta parte do enfeite de seu elmo fora e o fere no ombro, sua arma terminando cravada firmemente no chão, Muzubushi falha em retirá-la com velocidade devidos aos ferimentos e cansaço. Masakane aproveita a chance e desfere um terrível golpe contra Muzubushi, que só não o matou pois ele levantou o ombro para o sode da armadura lhe proteger, mesmo assim o golpe rasga-o terrivelmente no rosto. Finalmente Muzubushi, já cansado e sem forças, baixa a guarda e murmura uma curta prece a seus ancestrais. Masakane apenas lhe dá tempo suficiente de terminar a prece e, olhando nos olhos do famoso senhor Higoi Muzubushi, o elimina com um preciso golpe. 

O corpo do senhor de Toshi no Higo tomba diante do esconderijo da pequena dama, sangue de seu pai se mistura com as lagrimas silenciosas nas bochechas da garotinha.

- Prometi que deixaria sua família em paz. Masakane fala para o moribundo Muzubushi. - Mas não haverá paz para nenhuma carpa que não se ajoelhe diante dos Date, terei que pegar sua mulher como refém. Após falar isso olha para Mayumi com olhos frios como gelo. - Soube que tem uma filha, onde ela está?
Mayumi dá alguns passos para traz e saca uma fina aiguchi oculta em seu obi, mantendo-a estendida entre ela e o comandante Date. 

- Você prometeu que deixaria os Higoi em paz...

- Isso não é possível. Retruca Masakane, o motivo de tudo isso são os Higoi. Vocês devem lealdade aos Date e no entanto se rebelam, você e sua filha são necessários para atingirmos a paz, você como refém será o suficiente para seu primo finalmente se decidir em renovar seus votos ao clã Date. 

Só de pensar em Higoi Ooshibu, o autor do cisma de sua família traz nojo ao comandante Date, mas ele não demonstra isso. Masakane vê a postura de Mayumi e decisão nos olhos da jovem mãe, decide se aproximar com cautela para que ela não faça algo precipitado e force-o a se defender.  

- Agora...onde está sua filha?

- Nunca fomos dos Date, e nunca seremos! 

Com isso Mayumi vira a mortal lâmina de seu Aiguchi contra seu próprio pescoço e rasga sua veia direita. Masakane observa impotente ela cometendo Jigai e sua vida se esvaindo. Ele começa a correr em direção a Mayumi que mesmo morrendo se esforça para se manter dignamente em pé, Masakane alivia sua dor aparando-a nos próprios braços e assiste a vida da bela Mayumi fugir de seus olhos. O comandante Date repousa o corpo da senhora de Higo no Toshi no chão e toma um momento para se recuperar da dramática cena. Este momento foi necessário para se convencer que a morte deste honrado casal era necessária para a glória dos Date, o fato de que ele acabara de colocar um cão roliço e sem honra como líder dos Higoi era mera consequência.

- Achem a garota!. Masakane ordena para os demais samurais. Higoi Ooshibu não se renderá enquanto não souber que todos seus primos foram lidados, quero que tragam-na viva para mim! Chega de mortes!

Masakane não queria que aquilo terminasse assim, Muzubushi teria que morrer de qualquer forma pelo perigo que ele representa vivo e pelas várias mortes que ele promoveu contra os Date, mas Mayumi era uma legitima dama, não merecia morrer assim, se ela tivesse aceitado se tornar refém junto com sua filha isso seria o suficiente para os Higoi cessarem as hostilidades e Ooshibu teria que conviver com isso, mas preferiu o caminho de uma morte honrada. Quantas mortes são necessárias para se satisfazer a honra? Com a morte dos dois, com certeza o velho carpa asqueroso ficará feliz. Agora, tudo que está entre Ooshibu e a liderança total da família Higoi era uma pequena garotinha. Ooshibu  faria de tudo para tirar a vida da pequenina e ela em seus cuidados certamente teria um fim que ninguém poderia jogar a culpa no monstro sovina. Mas se a garota sobrevivesse e, de alguma forma ficasse longe das garras do velho, ele ia fumegar de frustração pelos restos minguantes de sua vida. E nada traria mais prazer a Masakane do que fazer Higoi Ooshibu sofrer.

Mas como resolver essa situação? Se a pequena dama se tornar um refém ela iria direto para Ooshibu que com certeza daria um jeito de mata-la, e isso significaria sangue inocente nas mãos de Masakane, deixá-la em paz, como prometera seria manter a fagulha da rebelião acesa e isso também seria inaceitável. Masakane tinha um dilema para resolver, e ele não via nenhuma saída nobre. Mas uma coisa era certa, primeiro deveria encontrar a garota.


Enquanto isso a pequena Muzumi se esconde no piso falso. A visão de seu pai logo alí morto a assombra ao mesmo tempo que se esforça para não gritar, seu rosto é banhado por lagrimas e sangue e assim ela fica no escuro, apenas esperando a chegada do silêncio. 

Glossário de Termos:

Aiguchi: Uma fina adaga que pode ser facilmente escondida nas vestes do usuário, comumente usada por mulheres e assassinos.

Kataginu: Vestimenta parecida com o Haori. O Katagino é usado por cima do kimono ou armadura e possui ombreiras exageiradas e triangulares, dando um aspecto de ombros largos ao usuário.

Kiai: Grito usado em conjunto com um golpe marcial. Muito utilizado nas artes marciais, como o Karate.


Sode: Peça de armadura com a finalidade de proteger os ombros e costas do usuário.

Parte 1
Parte 2
Parte 4